Escatologia

A Vinda - John Walvoord

A Vinda - John Walvoord

Introdução

Os eventos atuais têm chamado atenção como nunca antes quanto ao futuro reservado para o mundo, para a Igreja e Israel. Neste contexto é mais absolutamente normal que seja dada uma atenção especial à bendita esperança quanto ao retorno de Cristo para sua Igreja, e mais particularmente para o fato de se os crentes podem esperar o retorno iminente do Senhor.

Contudo, no mundo teológico impera uma grande confusão quanto a interpretação dos eventos proféticos. Grande parte da Igreja, ao optar pelo entendimento amilenista, continua a ignorar os sinais dos tempos. Entre os pós-milenistas pode ser encontrado uma grande variedades de pontos de vista, desde o extremo de estabelecimento de data a negação por alguns, bem como a negação quanto a esperança do retorno iminente do Senhor por outros. E a grande discussão de se a Igreja, o corpo de Cristo, passará pela grande tribulação, torna-se o centro do debate.

Quatro pontos de vista diferentes em relação ao arrebatamento têm sido desenvolvidos, dentre os quais o que é conhecido como meso-tribulacionismo e, a teoria do arrebatamento parcial. Entretanto, a grande disputa é entre pré e pós-tribulacionistas, já que o debate se desenvolve sobre se a Igreja deve passar pela grande tribulação para só então ser arrebatada, e assim os mortos em Cristo sejam ressuscitados e os vivos transformados e transladados.

Estudiosos relevantes podem ser encontrados em ambos os lados do debate. Em linhas gerais, a estratégia dos pós-tribulacionistas tem sido atacar a visão pré-tribulacionista partindo da premissa de que se eles podem refutar os argumentos pré-tribulacionistas, o pós-tribulacionismo poderá então ser estabelecido. Comumente, os pré-tribulacionistas têm apresentado suas razões para seu ponto de vista e se defendido contra os ataques pós-tribulacionistas. Contudo, o pós-tribulacionismo raramente tem sido submetido ao escrutínio sobre os argumentos que atualmente sustentam sua posição.

O propósito deste estudo é examinar os argumentos dos pós-tribulacionistas, sua exegese de importantes passagens e, quanto a maneira como lidam com os argumentos pré-tribulacionistas. Rapidamente ficará evidenciado que o pós-tribulacionismo não é uma posição monolítico tal como se caracteriza o pré-tribulacionismo, já que atualmente, o pós-tribulacionismo, abriga uma grande diversidade de premissas e argumentos teológicos. Enquanto um pré-tribulacionista deve ser necessariamente um pré-milenista que interpreta a profecia literalmente e tem uma grande consideração quanto a inerrância e autoridade das Escrituras, um pós-tribulacionista pode ser um amilenista, um liberal, ou um pré-milenista conservador.

Neste estudo, os pontos de vista liberal e amilenista serão ignorados, já que o foco será direcionado particularmente ao pós-tribulacionismo conforme defendido dentro do pré-milenismo. Contudo, ficará evidente que no pós-tribulacionismo pré-milenista há diferentes escolas de pensamentos conflitantes e contraditórias.

Quatro linhas de pensamento pós-tribulacionistas serão analisadas na presente obra. Um esforço será feito para apresentar os pontos fortes e as fragilidades de cada posição, mas também será dada uma atenção toda especial às inconsistências lógicas que frequentemente transpiram de seus argumentos. No geral, os pré-tribulacionistas são críticos em relação ao pós-tribulacionismo em três pontos principais.

Primeiro, os pós-tribulacionistas variam bastante em sua doutrina das Escrituras. Praticamente toda escola que nega a inerrância da bíblia é pós-tribulacionista. Em contraste, um pré-tribulacionista, pela natureza de seus argumentos, admite a autoridade e a inerrância da Bíblia. Entretanto, neste livro não discutiremos essa falha pós-tribulacionista, pois a visão pós-tribulacionista comumente se baseia na autoridade das Escrituras.

Segundo, os pós-tribulacionistas diferem bastante em seu método de interpretação. O pós-tribulacionista que é amilenista tende a espiritualizar a profecia de tal forma que seu pós-tribulacionismo é invariavelmente fruto da espiritualização. Esse é o motivo pelo qual os amilenistas raramente discutem essa questão. Nos círculos pré-milenistas esse também é um grande problema, pois os pós-tribulacionistas não concordam entre si sobre os princípios de interpretação da profecia, já que todos pós-tribulacionistas, em alguma medida, espiritualizam os textos proféticos quando estes se relacionam com a doutrina do arrebatamento. Até mesmo um pós-tribulacionista como Robert Gundry, com todo seu esforço para seguir uma intepretação literal da profecia, tende a espiritualizar qualquer profecia que possa conduzir ao pré-tribulacionismo.

Terceiro, um dos problemas mais críticos do pós-tribulacionismo é o uso indevido do método indutivo da lógica. Como a teologia é uma ciência altamente indutiva, suas conclusões são baseadas particularidades encontradas na exegese das Escrituras. Será demonstrado que o pós-tribulacionismo tende a selecionar certos fatos em determinadas passagens e ignora suas evidentes conclusões contraditórias. Considerando que todos os detalhes da profecia não são levados em consideração, as conclusões tornam-se bastante ilógicas. Os pré-tribulacionistas sustentam que o pós-tribulacionismo tem por base princípios errôneos de interpretação, de lógica, ou ambos. Resumindo, os pós-tribulacionistas não são consistentes na intepretação da profecia em seu sentido simples literal e violam os princípios básicos da lógica indutiva, selecionando apenas os pontos que apoiam sua posição e ignorando todas evidências contraditórias. Esses detalhes ficaram evidentes na discussão dos vários aspectos do pós-tribulacionismo.

É esperado que essa análise do pós-tribulacionismo venha servir para esclarecer questões e prover um melhor entendimento sobre as conclusões de muitos especialistas em profecia, demonstrando, que o pré-tribulacionismo é a posição mais coerente quando todos os detalhes são levados seriamente em consideração. Muitos creem que o cumprimento do tão aguardado retorno do Senhor para sua Igreja é iminente e ocorrerá antes dos grandes eventos dos fins dos tempos, descritos na Bíblia como a grande tribulação.

O dilema se a Igreja passará pela grande tribulação, ou será arrebatada antes desse tempo de tribulação sem precedentes é muito mais que uma mera questão teológica. Para muitos pré-tribulacionistas a esperança do retorno do Senhor é uma verdade muito preciosa. Na medida em que os santos anseiam pela vinda do Senhor e sua reunião com ele para começar a desfrutar da maravilhosa experiencia de estar para sempre com o Senhor, é também seu desapontamento diante da possibilidade de uma grande tribulação, martírio e morte. Pode ser difícil apresentar qual seria o maior contraste entre a bendita esperança quanto ao iminente retorno de Cristo expectativa de prováveis sofrimentos e morte durante a grande tribulação. Portanto, o debate entre pré-tribulacionistas e pós-tribulacionistas, embora conduzido e fundamentado na revelação Divina, envolve questões emocionais também. As alternativas são drasticamente diferentes, e com as diferenças vem um futuro dramaticamente distinto. A afirmação de alguns pós-tribulacionistas de que os pontos de vista diferem superficialmente não é apoiado pelo nítido contraste na escatologia apresentada por pré-tribulacionistas e pós-tribulacionistas.

Aqueles que desejam obter uma visão geral do debate – incluindo algumas considerações sobre o meso-tribulacionismo e o arrebatamento parcial, assim como mais argumentos em defesa do pré-tribulacionismo – encontraram esses assuntos conforme já foram tratados em uma anterior do mesmo autor, O Arrebatamento, também já publicada pela Editora Carisma.

Capítulo 1
O surgimento do pós-tribulacionismo

Na história da Igreja, a teologia sistemática tem sido uma ciência em desenvolvimento. E com tal desenvolvimento, controvérsias em várias áreas da teologia tem se seguido, até certo ponto, nas principais doutrinas tratadas na teologia sistemática. Nos primeiros séculos as controversas teológicas mais importantes estavam relacionadas às próprias Escrituras. Durante o período pós-apostólico, alguns grupos, como os Montanistas, reivindicavam ter a mesma autoridade e inspiração tal como os Apóstolos que escreveram as Escrituras. Já no início a igreja rapidamente reconheceu isso como uma heresia, e no Concílio de Laodiceia em 397 d.C o cânon foi considerado fechado ainda que alguns livros apócrifos foram reconhecidos pela Igreja Católica Romana posteriormente.

Com o estabelecimento das Escrituras como o fundamento para a teologia sistemática, o foco rapidamente foi direcionado para a doutrina da trindade, assim as controvérsias trinitarianas ocuparam o centro das atenções. Em 325 d.C. a aprovação do credo Niceno reconheceu a plena divindade de Jesus Cristo como uma pessoa distinta do Pai, preparando as bases para o reconhecimento da doutrina da trindade como é sustentada na ortodoxia hoje. Somente a partir do Concílio de Constantinopla em 381 que o Espírito Santo teve sua devida posição na Divindade. Sequencialmente, a igreja voltou sua atenção à doutrina do pecado e do homem, embora essa questão tenha sido menos disputada, como evidenciado no Concílio de Orange em 529 d.C.

Finalmente, na Reforma Protestante, o conceito Agostiniano de justificação pela fé foi restaurado. Com o afastamento das Igrejas protestantes da Igreja Católica Romana, não somente a soteriologia, a doutrina da salvação pela graça, foi firmemente estabelecida, junto a importantes doutrinas relacionadas à eclesiologia – tal como o sacerdócio de todos os santos e o direito de cada crente interpretar as Escrituras sob a direção do Espírito, foram os temas centrais da reforma protestante.

Contudo, na história da Igreja, a escatologia continuou sendo uma doutrina não estabelecida. Embora inicialmente a igreja nos primeiros dois séculos foi predominantemente quiliasta e tenha sustentado que o segundo advento de Cristo seria seguido por um reinado de mil anos sobre a terra, essa interpretação foi rapidamente desafiada com o surgimento da escola alexandrina, conduzida por Clemente de Alexandria e por Orígenes. Muito esforço foi investido para harmonizar a teologia sistemática com a filosofia platônica. Como isso só foi possível a partir de uma interpretação bíblica não literal e tratando as Escrituras como uma grande alegoria onde o sentido literal não era o sentido real, muito do significado literal foi perdido, incluindo a crença em um milênio literal após o segundo advento.

Inicialmente tanto a igreja como os teólogos ortodoxos consideraram herética a escola alexandrina e dissonante das posições predominantes da teologia bíblica. Contudo, os efeitos práticos do surgimento dessa escola de interpretação suplantou a interpretação pré-milenista das Escrituras.

Dessa forma, no quarto e quinto séculos, com Agostinho, um consenso foi estabelecido para separar a escatologia das demais disciplinas da teologia sistemática. Dois princípios de interpretação foram adotados por Agostinho – uma interpretação literal, histórico e gramatical para passagens não escatológicas[1], e uma interpretação não literal ou figurativa para os textos de caráter profético[2]. O resultado foi que, embora a igreja Romana tenha mantido muitos dos ensinos bíblicos, continuou a usar o método não literal para interpretar a profecia. Assim, o amilenismo tornou-se a posição aceita pelos romanistas. Com o início da Reforma Protestante, os reformadores retornaram a Agostinho e mantiveram seu método de interpretação da profecia. Os reformadores foram todos amilenistas e opostos ao pré-milenismo.

Como efeito da reforma protestante, com a multiplicação das igrejas independentes e denominações, era mais que normal que todas as áreas da teologia sistemática fossem reexaminadas novamente, incluindo a escatologia. O pré-milenismo que incluiu entre seus defensores alguns que mantiveram pontos de vista extremados, veio a ser solidificado e coerente em sua interpretação bíblica. Esse fato tornou-se evidente.

A partir da última metade do século XIX, grandes conferências bíblicas foram realizadas, tais como a American Bible e Prophetic Conference in America[3] e a Society for the Investigation of Prophecy[4] e Powercourt Conferences[5] nas Ilhas Britânicas. De modo feral, esses eventos e seus ministros foram patrocinados por interpretes bíblicos conservadores os quais em sua maioria promoveram o pré-milenismo. Desse meio saiu um sistemático e detalhado estudo da profecia que trabalhou minunciosamente os detalhes proféticos e restabeleceu a doutrina do segundo advento de Cristo como um dos temas centrais da fé cristã. O estudo mais abrangente e detalhado da profecia levou ao entendimento mais claro entre os contraste que há entre o pós-milenismo, pré-milenismo e amilenismo.

Os principais pontos de vista sobre o segundo advento

Com o declínio do pré-milenismo após os dois primeiros séculos da igreja, o amilenismo dominou todos os principais segmentos do cristianismo. Diferentes explicações foram dadas a passagens proféticas que claramente ensinavam o pré-milenismo. A visão predominante era que não haveria nenhum milênio, ou um reinado de Cristo de mil anos literais após o segundo advento, mas sim um novo céu e a nova terra junto ao estado eterno que seria imediatamente estabelecido após o retorno de Cristo. Passagens relacionadas a um reino governado por Cristo sobre a terra foram consideradas como sendo a realidade entre os dois adventos, e uma descrição de toda era cristã, ou dos últimos mil anos antes da segunda vinda de Cristo.

Logo após a reforma protestante – com a diversidade de opiniões teológicas o protestantismo se dividiu em vários grupos e denominações – uma visão divergente do amilenismo surgiu, sendo conhecida como pós-milenismo. Embora pontos de vista semelhantes tenham sido mantidos por vários indivíduos anteriormente, o atual pós-milenismo é atribuído a Daniel Whitby (1638-1726).[6] Esta nova posição considerou o surgimento da igreja e a pregação do evangelho como sendo o triunfo e inauguração da era de ouro onde, por mil anos, a igreja iria florescer sobre o mundo.

Esse período de mil anos teria seu clímax com o segundo advento de Cristo, tal como ensinado pelo amilenismo.

Após Whitby, surge algumas variações no pós-milenismo, alguns sendo relativamente bíblico como demonstrado em Charles Hodge[7], um teólogo do século dezenove. Outros identificaram o otimismo do pós-milenismo com a evolução orgânica exposta por teólogos liberais tais como Albrecht Ritschl[8], Washington Gladen[9], e Walter Rauschenbusch[10]Em alguns casos, o pós-milenismo tornou-se indistinguível do amilenismo se tornando termo intercambiáveis. Contudo, em linhas gerais, o pós-milenismo normalmente adota uma visão mais literal sobre o milênio entende-o como uma era de ouro mediante o triunfo da igreja sobre a terra.

Durante o último século uma nova vertente doutrinária definiu o reino milenar de Cristo como se referindo a estado intermediário. Esse pensamento é comumente atribuído aos teólogos Duesterdieck (1859) e Kliefoth (1874).[11] Essa nova visão ensina que o milênio é realizado no céu, não na terra. Essa interpretação tem por base Apocalipse 20. Diante de tantas variações de amilenismo e pós-milenismo, que evidenciou a insatisfação com essa posições, o pré-milenismo emerge como uma opção viva.

Após a última metade do século dezenove, a evolução Darwiniana começou a ocupar destaque entre os pós-milenistas. Os liberais abraçaram a teoria da evolução, com seu atraente otimismo, como um verdadeiro método divino para trazer a predita era de ouro. Reconhecendo esse fato como um afastamento da fé, pós-milenistas e amilenistas mais conservadores se esforçaram para refutar esse novo conceito evolucionário. Um dos meios utilizados foi a organização de conferências proféticas realizadas na última metade do século dezenove tendo continuidade no século vinte.

Como os amilenistas e pós-milenistas têm pouco a oferecer para refutação do conceito do progresso evolutivo, essas conferências rapidamente foram dominadas por pré-milenistas. Muitas das doutrinas que mais tarde se tornaram parte essencial ao pré-milenismo foram introduzidas na discussão, tal como a restauração de Israel à sua terra, um futuro período de tribulação e aflição sobre a terra, uma vinda corpórea e literal de Cristo sobre a terra em seu segundo advento, e um reino literal de mil anos sobre a terra após o segundo advento de Cristo. Esses estudos escatológicos renovados trouxeram à tona, mais do que nunca antes, os problemas relacionados a interpretação das Escrituras.

A principal questão foi se Agostinho estava certo quanto a profecia ser interpretada em um sentido não literal. Os pré-milenistas insistem que o ponto partida que conduziu a um amilenismo e pós-milenismo o método de intepretação errôneo em que a profecia foi considerada como um literatura especial sendo então interpretada de forma não literal. Assim então, esses pré-milenistas voltaram ao ponto de partida, ao ponto de vista dos primeiros pais da igreja, que tinha sido predominantemente pré-milenistas, afirmando assim serem os restauradores da verdadeira fé bíblica dos primeiros séculos da igreja.

A hermenêutica escatológica

A questão central que separou pré-milenistas de amilenistas rapidamente se tornou aparente. A questão era se a Bíblia havia ou não profetizado uma restauração literal da nação de Israel. O povo literalmente retornaria mais uma vez para sua antiga terra e seria restaurado como uma nação? Se as profecias fossem interpretadas literalmente, as heresias poderiam aumentar, o mal predominaria no fim dos tempos, e a grande tribulação poderia, enfim, começar?

O ponto mais importante era saber se as diversas profecias do Antigo Testamento que descreviam um reino glorioso sobre a terra, onde todas as nações estariam sob a sujeição de Cristo e Israel seria uma nação proeminente, teriam seu cumprimento literal. Haveria realmente um reino de mil anos durante o qual Cristo reina sobre a terra, começando com o segundo advento e a ressurreição dos santos e culminado com o julgamento divino sobre os ímpios? O Diabo realmente estaria preso e inativo por mil anos? Se sim, afirmavam os pré-milenistas, Cristo deve vir antes dos mil anos e não após. Amilenistas conservadores frequentemente concordam que se as profecias forem interpretadas literalmente, o pré-milenismo é a resposta óbvia, mas continuam insistindo que não deve ser interpretada literalmente.

A discussão sobre o surgimento do pré-milenismo como uma doutrina defendida pela igreja, é mais que natural que outras questões sejam levantadas, como a relação das profecias que dizem respeito ao arrebatamento ou translado da igreja e a questão de como tudo isso se encaixa no plano profético. Amilenistas e pós-milenistas colocaram o translado junto ao segundo advento de Cristo, mas logo surgiu entre os pré-milenistas uma visão de que a vinda de Cristo para sua igreja era um evento distinto, que devido sua relevância, poderia ocorrer antes da grande tribulação e não após. Visões divergentes do pré-tribulacionismo e pós-tribulacionismo ganham destaque no estudo da profecia pelo fato de serem variantes do pré-milenismo.

Variações no pós-tribulacionismo

Na escatologia como um todo bem como dentre as controvérsias em relação ao tempo do arrebatamento da igreja na sequência dos eventos no programa profético, o pós-tribulacionismo continua a ser a visão majoritária. Pois é a posição mantida pelos teólogos liberais, os quais tendem a considerarem as profecias de forma não literal. É também adotado por toda forma de amilenismo e pós-milenismo, por interpretarem as profecias em um sentido não literal. Foi apenas no pré-milenismo que surgiu a oposição ao pós-tribulacionismo.

Contudo, entre os pós-tribulacionistas, uma diversidade de explicações e interpretações têm caracterizado a história da doutrina. Embora a igreja nos primeiros dois séculos fosse pré-milenista, os pais pós-apostólicos tinham a tendência de identificar as perseguições de seu tempo como sendo a grande tribulação que precedia imediatamente o segundo advento. Ainda assim, eles normalmente preservavam no entendimento de que vinda de Cristo poderia ocorrer a qualquer momento, e não contemplaram um período entre o arrebatamento da igreja e a segunda vinda de Cristo para estabelecer seu reino de mil anos.[12] Entretanto, embora o pós-tribulacionismo dos Pais seja bem diferente de muitas formas de pós-tribulacionismo atuais, sua visão sobre o arrebatamento da Igreja foi colocada junto ao segundo advento.

A maioria dos primeiros Pais da Igreja, contudo, fez pouco para refinar a doutrina e resolver os conflitos evidentes em sua posição. O problema da iminência do arrebatamento, quando eventos antecedentes ao segundo advento deveriam se cumprir, parece não ter causado preocupação. Houve um grande silêncio entre os primeiros Pais em relação a todo o problema de sua posição, pois pareceu não ter relevância. Com o surgimento do amilenismo no terceiro século, houve pouco incentivo para estudar os problemas do pós-tribulacionismo, e houve pouco ou nenhum progresso no estudo da escatologia até a Reforma Protestante.

Os reformadores, retornando a Agostinho, livraram a igreja da doutrina do purgatório e outras invenções do Catolicismo Romano, mas aparentemente não levantaram qualquer questionamento sobre o arrebatamento da igreja como um evento distinto do segundo advento. Foi somente quando o pré-milenismo começou a insistir em uma interpretação literal da profecia e a examinar o programa profético para Israel e seus detalhes, que começou a ser levantada a questão sobre se o arrebatamento, em vista de sua importância, pode ser harmonizado com a doutrina que declara que Cristo voltará para estabelecer o reino.

No último século tem surgido uma variedade de pós-tribulacionismo, alguns deles bem recentes quantos aos detalhes e pontos principais. No geral, cobrem uma gama considerável de possibilidades.

J. Barton Payne, em seu livro Imminent Appearing of Christ [Aparição Iminente de Cristo],[13] defende um retorno ao que ele diz que era a posição da igreja em seu início, isto é, um pré-milenismo pós-tribulacionista que espiritualiza a grande tribulação e a identifica com os problemas contemporâneos do cristianismo. Alguns tem seguido a Payne, contudo, tendo em vista que a tendência de espiritualizar o período da tribulação é uma característica do pós-tribulacionismo em todas as suas formas.

Alexander Reese, em seu livro Approaching Advent of Christ [Abordando o Advento de Cristo],[14] apresentou a mais detalhada defesa do pós-tribulacionismo. A forma popular de seu pós-tribulacionismo tem como ponto central a doutrina de que a igreja é o verdadeiro Israel e inclui os santos de todas as eras.

Oswald Allis, um proeminente amilenista, também defende esse ponto de vista.[15] Considerando que as Escrituras, mesmo da perspectiva pré-milenista, claramente demonstra os santos ou um povo redimidos na futura grande tribulação, esta forma de pós-tribulacionismo conclui ser inquestionável que a Igreja passará pela grande tribulação. Essa posição faz de ambos, Igreja e Israel, um só povo compartilhando de uma mesma escatologia.

O livro de Reese também oferece evidências de que a ressurreição da Igreja ocorre no mesmo momento da ressurreição de Apocalipse 20. As principais ênfases se relacionam a termos como “aparição”, “o dia”, “o fim”, e “revelação”, como termos técnicos que conectam o arrebatamento a segunda vinda com o fim da presente era. Provavelmente, Reese foi um dos melhores expoentes do pós-tribulacionismo e, escritores posteriores que defendem o pós-tribulacionismo, habitualmente se valem de seus argumentos.

No pós-tribulacionismo é comum identificar a doutrina com a ortodoxia já que isso foi feito pelos reformadores e pelo teólogo de Roma, Agostinho. Sustentando que o pós-tribulacionismo é a posição histórica da Igreja, seus defensores rotulam qualquer outra visão como um afastamento do cristianismo histórico.

Todas as demais visões já mencionadas, consideram que a Igreja já está na grande tribulação e, identificam as provações experimentadas por ela através dos séculos como cumprimento de profecias sobre um tempo de tribulação que precede o segundo advento de Cristo.

Contudo, uma escola de interpretação futurista tem surgido dentro do pós-tribulacionismo. Um de seus mais proeminentes defensores é George Ladd cuja obra, The Blessed Hope [A bendita esperança][16], promove a visão de que a grande tribulação ainda é futura. Enquanto outros pontos de vista pós-tribulacionistas aceitam a ideia de que Cristo pode voltar a qualquer momento, Ladd considera inevitável que ao menos um período de sete anos (descrito em Daniel 9.27) separa a Igreja hoje do arrebatamento e o segundo advento de Cristo que são aspectos do mesmo evento. Embora seu argumento se fundamente amplamente no aspecto histórico da doutrina e exalte o pós-tribulacionismo como o padrão da ortodoxia no decorrer dos séculos, ele apresenta um novo conceito ao defender uma futura tribulação literal. Sua posição tem sido de alguma forma qualificada por seus escritos posteriores mas, no geral, sustenta uma visão futurista da grande tribulação onde o retorno de Cristo não pode ocorrer a qualquer momento, mas somente após os anos relacionados à grande tribulação cumprindo assim as profecias que dizem respeito a esse período.

Outra teoria pós-tribulacionista foi desenvolvida por Robert Gundry em sua obra, The Church and the Tribulation [A igreja e a grande tribulação][17] Gundry, seguindo os passos de muitos pré-milenistas, distingue Israel e Igreja como entidades separadas e se esforça para interpretar literalmente muitas das profecias que lidam com o fim dos tempos. Ao desenvolver sua teoria, ele refuta diversos pós-tribulacionistas que o precederam. Trabalhando com essas premissas, Gundry se empenha para estabelecer um novo tipo de pós-tribulacionismo tentando harmonizá-lo com um interpretação literal da profecia.

A obra de Gundry apresenta uma série de problemas teológicos tanto para outros pós-tribulacionistas como para pré-tribulacionistas contemporâneos. Pelo fato de seus argumentos serem novos em parte, e proporem um tipo de pós-tribulacionismo nunca desenvolvido antes, seu trabalho acaba sendo algo inédito e cria portanto a necessidade de um estudo mais detalhado do pós-tribulacionismo na história da igreja. Os capítulos que se seguem apresentarão uma análise dos pontos fortes e das fragilidades dessas várias posições pós-tribulacionistas e suas interpretações conflitantes com a profecia em geral.

[1] RAMM, Bernard. Protestant Biblical Interpretation. Boston, W.A. Wilde Co., 1950, p. 10.
[2] ALLIS, Oswald T., Prophecy and the Church. Philadelphia: Presbyterian and Reformed Publishing Co., 1945, p. 3.
[3] WEST, Nathaniel, ed. Premillennial Essays. New York: Fleming H. Revell Co., 1879.
[4] SANDREEN, Ernest R. The Roots of Fundamentalism. Chicago: University of Chicago Press, 1970, p.22-25
[5] Ibid., p. 34-41
[6] STRONG, Augustus. Sistematic Theology, 7ª ed. Philadelphia: A.C. Armstrong & Son, 1902, p. 1014.
[7] Charles Hodge. Systematic Theology, 3 vols. New York: Charles Scribner’s Sons, 1895, 3:790-880.
[8] Albrecht Rischl. The Christian Doctrine of Justification and Reconciliation. Clifton: Reference Book Publishers, 1966.
[9] Richard D. Knudten, The Systematic Thought of Washington Gladden. New York: Humanities Press, 1968, p. 111-17.
[10] Walter Rauschenbusch, A theology for the Social Gospel. New York: Macmillan Co., 1922, p. 131-66.
[11] B.B. Warfield, Biblical Doctrines. New York: Oxford University Press, 1929, p. 629-64.
[12] Adolph von Harnack, History of Dogma, trans. Neil Buchanan, 7 vols. New York: Dover Publications, 1961, 1:168.
[13] J. Barton Payne. The Imminent Appearing of Christ. Grand Rapids: Eerdmans, 1962.
[14] Alexander Reese. The Approaching Advent of Christ. London: Marshall, Morgan & Scott, 1937
[15] Allis. Prophecy and the Church.
[16] George Ladd. The Blessed Hope. Grand Rapids: Eerdmans, 1956.
[17] Robert Gundry. The Church and the Tribulation. Grand Rapids: Zondervan, 1973.

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Comentários (1)

GLEIGMAR OLIVEIRA 15/11/2023

Alguém noção da data que este livro será lançado?

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